A construtora deve indenizar seus clientes por atraso de 13 meses na entrega de imóvel. Este é o entendimento da 16a Vara Cível de São Luís, em decisão proferida no último dia 28. A sentença condena a Empreendimentos Vale ao pagamento de R$ 78.000,00 (setenta e oito mil reais) aos autores, pelos lucros cessantes consubstanciados em 13 (treze) meses de hipotético aluguel no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária, pelo INPC, a contar de cada mês de atraso.
Deverão os réus, ainda arcar com os danos emergentes experimentados autores da ação (dispêndio com depósito de mobília), pelos pagamentos realizados, no total de quantia de R$ 6.600,00 (seis mil e seiscentos reais), acrescida de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação e correção monetária, pelo INPC, a contar do efetivo prejuízo (data de cada pagamento realizado), bem como ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a cada um dos autores, pelos danos morais experimentados, com acréscimo de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, e correção monetária, pelo INPC, a partir desta data.
O caso – Narram os autores terem firmado com a construtora requerida contrato de promessa de compra e venda, em 04.08.2010, do apartamento 501, da Torre Assunção, do Condomínio Residencial Leony do Vale, localizado na Rua do Farol, nº 12, Ponta do Farol, em São Luís, com previsão de entrega do imóvel para fevereiro/2011. Alegam, ainda, que residiam no Estado de Mato Grosso, mas com perspectivas de remoção para esta capital em dezembro de 2010, tendo em vista problemas de saúde que acometiam a genitora de um dos requerentes, o que teria motivado, inclusive, a escolha do empreendimento.
Após sucessivas alterações na data de entrega do imóvel, somente receberam em abril de 2012, mesmo com problemas internos na unidade, afirmaram os autores, que aduzem ter sofrido, nesse período, diversos transtornos decorrentes do atraso, a exemplo de terem que depositar seus pertences na cidade de Cuiabá (MT) e se acomodarem na casa de parentes nesta capital, após serem transferidos. Ademais, afirmam terem sido privados da utilização da área comum do condomínio – que ainda estava em obras – por período superior a 4 (meses) desde a mudança, além de terem experimentado problemas de segurança, limpeza e organização da referida área, tendo em vista que a assembleia de instalação do condomínio somente ocorreu em 18 de agosto de 2012.
Sustentam, por fim, que em razão de pequenos defeitos na unidade, a exemplo da recolocação de parte do piso, foram submetidos a desmontagem e remontagem de móveis planejados, quando já residiam no apartamento. A construtora apresentou contestação, em cujo teor alega que o contrato entabulado entre as partes dispõe tão somente de uma previsão da data de entrega do imóvel, mas não a define categoricamente, podendo haver a estipulação de outra data, ou sua prorrogação, o que é comum em toda obra”.
Argumentou, ainda, que o atraso da obra se deu por caso fortuito ou força maior e por culpa concorrente dos autores, o que estaria, no seu entender, a isentá-la de responsabilidade no caso concreto. Para tanto, sustenta que entre 2011 e 2012 o setor de construção civil no Maranhão experimentou agudo prejuízo desencadeado por greves de operários, bem assim, que os autores, por anuência tácita da construtora, além de pleitearem mudanças no projeto inicial do imóvel, optaram por personalizar o apartamento, com correções de pintura, torca de pisos e forro. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos.
O Banco Bradesco S/A apresentou sua peça de defesa em que suscita preliminares de ilegitimidade passiva ‘ad causam’ e inépcia da inicial. No mérito, alega que os prejuízos que teriam sofrido os autores decorreram unicamente pelos atos da primeira requerida, pelo que requer a improcedência dos pedidos contra si imputados. A Audiência preliminar levada a efeito em novembro de 2014 terminou sem acordo, pois as partes não entraram em consenso quanto a valores. Em seguida, após desistência da construtora acerca da produção de prova pericial, as preliminares suscitadas pelo banco foram rejeitadas pela Justiça.
“A demanda em questão cinge-se à análise do dever dos réus em indenizar os autores pelos danos materiais (danos emergentes e lucros cessantes) e danos morais que afirmam terem suportado em virtude do atraso na entrega da obra. Cumpre observar que se trata de relação consumerista, pois as partes que a compõem são fornecedor e consumidor de bens e serviços, nos termos do artigo 2º e 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Logo, a contenda deve ser solvida à luz das regras e princípios que informam o microssistema de normas protetivas, sem prejuízo da aplicação subsidiária do Código Civil, a fim de materializar o diálogo das fontes”, fundamenta a sentença.
E segue: “Nesse sentido, fixada a incidência do CDC, observo que a responsabilidade civil infligida ao fornecedor de bens e serviços é objetiva. Assim, para que o dever de indenizar seja devidamente configurado, basta a comprovação da existência do fato, do dano e do nexo causal, sem qualquer análise de culpa. Desse modo, o fornecedor só não será responsabilizado quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste ou a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro. É o que preceitua o § 3º do referido artigo 14.Pois bem”.
Sustentam os autores que nada obstante o instrumento contratual firmado entre as partes ter previsto o prazo de entrega do imóvel para fevereiro/2011 somente lograram êxito em recebê-lo, a muito custo e ainda que parcialmente inacabado, em abril/2012. “Quanto ao atraso, a construtora requerida alega que a data de entrega do contrato não possui natureza absoluta, pelo que cabível a prorrogação, recorrente e admissível no ramo de construção civil. Sucede que para além da obrigatoriedade de se apor, em contratos da espécie, a data de previsão de entrega do empreendimento, inexiste no contrato entabulado entre as partes a comumente utilizada cláusula de tolerância, geralmente de 180 (cento e oitenta) dias”, explanou o Judiciário.
“Nesse cenário, a data de entrega da obra estipulada no contrato consistiu em obrigação assumida pela construtora requerida, de modo que sua inobservância foi responsável por constituir-lhe em mora a partir do mês seguinte, ou seja, março/2011. Assim, sobreleva analisar a responsabilidade dos requeridos sobre este fato. Sobre a responsabilidade da instituição financeira, BANCO BRADESCO S.A., observo que o Anexo I do contrato em discussão (fls. 93/97) esclarece que, apesar de a construtora ser a proprietária do terreno (fl. 25), incidia sobre o bem uma hipoteca em favor do banco”, ressalta a sentença. “(…) Portanto, não existe vínculo jurídico entre o banco e os autores em relação a construção do imóvel e nem eventual culpa do banco financiador sobre problemas na execução da obra, cabendo somente a construtora que figurou como contratante os deveres e obrigações decorrentes do pacto”.
Neste caso, afirma a construtora ré que o atraso na entrega do imóvel se deu por circunstâncias que saíram do controle de sua atuação, o que estaria a configurar, no seu entender, a isenção de responsabilidade. Informa, pois, que o cronograma da obra foi diretamente influenciado por greves da construção civil durante o período de construção. “Contudo, não merecem prosperar os fundamentos aventados”, destaca a Justiça, observando que “o Código Civil diz que o caso fortuito ou de força maior existe quando uma determinada ação gera consequências e efeitos imprevisíveis, impossíveis de evitar ou impedir, o que não é visto neste caso, pois as situações elencadas pela construtora demandada fazem, indubitavelmente, parte de sua esfera de previsibilidade”.
Por fim, a Justiça julgou improcedentes os pedidos em relação ao Banco Bradesco S/A e parcialmente procedentes quanto a Empreendimentos Vale LTDA, nos termos já expostos nos primeiros parágrafos.




